Rio: mortes fazem ações ser questionadas

Por Roberta Jansen, Estadão Conteúdo

Em um mês marcado por operações policiais violentas, que culminaram na morte do estudante Marcos Vinícius da Silva, de 14 anos, no Complexo da Maré, zona norte, especialistas em segurança pública e moradores de comunidades questionam o modelo das operações e a própria intervenção federal.

Somente nas duas últimas semanas, foram 14 pessoas mortas em operações das forças de segurança no Chapéu Mangueira-Babilônia, na zona sul, e no Complexo da Maré, na zona norte. Com exceção de Marcos Vinícius, os outros mortos eram, segundo a polícia, traficantes que teriam recebido os policiais a tiros e acabaram mortos.

“Isso não é mais admissível”, afirmou a especialista em segurança pública Jaqueline Muniz, da Universidade Federal Fluminense (UFF). “Não aceito mortes de cidadãos nem de policiais, isso não é resultado que se apresente. Se tem morte, não é eficaz, não importa quem morreu.”

A diretora do Observatório da Intervenção, a socióloga Sílvia Ramos, também frisou que não se pode “naturalizar” a morte de supostos criminosos. “É um protocolo preocupante, a polícia está entrando nas comunidades para matar criminosos”, ressaltou.

Vingança

A Secretaria de Segurança e o Gabinete da Intervenção Federal seguem sem se pronunciar, apesar dos sucessivos pedidos de entrevista. A Polícia Civil também não dá entrevistas, mas divulgou na sexta-feira, 22, uma nota.

Segundo o texto, a polícia está “empenhando todos os esforços” para esclarecer a morte de Marcos Vinícius. “Outro inquérito apura as circunstâncias das mortes dos seis homens, que receberam os policiais sob intenso tiroteio. Até o momento foi apurado que um deles é o chefe do tráfico no Caju e outro estava com uma tornozeleira eletrônica”, diz.

De acordo com moradores, no entanto, os seis homens foram executados em uma ação que seria uma vingança contra a morte do detetive Ellery de Ramos Lemos, no dia 12, em Acari. Na ocasião, vários policiais juraram vingança aos responsáveis pela morte.

Helicóptero

Um outro ponto muito criticado por moradores e especialistas foi o uso do helicóptero blindado, chamado de caveirão aéreo, para disparar tiros contra a comunidade, o que vem se tornando recorrente em operações da Polícia Civil. A organização não governamental (ONG) Redes da Maré contabilizou mais de 59 marcas de tiros vindos do alto em uma área de apenas 280 metros.

“O objetivo da polícia em qualquer operação deve ser prover segurança, ela não pode ser um fator de insegurança para a comunidade; não pode fazer uma operação motivada por vingança, pelo olho por olho”, afirmou Jaqueline Diniz. “A polícia não pode ser uma força provocativa, não pode chegar dando tiro, rajada, abrindo clarão na mata; isso é bonito em filme da Tela Quente (sessão de filmes da TV Globo), mas não funciona assim (no dia a dia).”

A diretora da Redes da Maré, Eliana Sousa Silva, lembra que nas 16 favelas que formam o Complexo da Maré vivem cerca de 140 mil pessoas, em um raio de menos de cinco quilômetros. “Estamos extremamente indignados, é uma área muito densa, causa pânico um helicóptero dando rasantes e atirando”, afirmou.

Na análise de Jaqueline Diniz, quem acaba se beneficiando dos sucessivos confrontos entre polícia e traficantes são os milicianos que, nos últimos dez anos, praticamente dobraram sua área de atuação. “É um circulo vicioso: naturalizamos as mortes e não avançamos nada no controle do crime, não há nenhum avanço sobre a economia do crime”, afirmou. “E qual o resultado de toda essa bateção de cabeça? É o aumento do poder da milícia no Rio. Estão liberando os territórios para a milícia.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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