Jovens querem mudanças, mas índice de desinteresse pela política é alto, aponta pesquisa

Uma pesquisa realizada pelo Ministério Público do Paraná e pela Secretaria Estadual da Educação confirmou o que muitos já desconfiavam: os jovens não se interessam (como deveriam) pela política. A constatação é preocupante porque eles é que irão, em pouco tempo, legislar e comandar o País, o qual passa por um momento de transformação com prisões e condenações de corruptos e corruptores, muitos, velhos personagens do cenário político nacional.

O levantamento, que contou com a participação de 10.952 alunos de ensino médio de 176 escolas públicas do estado, foi realizado em outubro de 2017 e divulgado na semana passada e entre os dados relevantes, apontou que os jovens paranaenses apresentam pouco conhecimento sobre o funcionamento das instituições políticas e baixo nível de engajamento social. Por outro lado, os estudantes manifestaram desejo de mudanças na realidade brasileira, que, na opinião deles, é marcada pela ineficiência de diversos serviços públicos. Eles também concordam que a educação para a cidadania deve estar mais presente nas escolas.

Resultados

A política estudantil, conforme os resultados da pesquisa, não tem atraído os adolescentes: apenas 5,54% deles declararam participar ativamente dos grêmios estudantis, enquanto 13% participam “às vezes”, contra 81,4% de alunos que nunca participaram dos grêmios ou sequer sabem de sua existência como instância de representação dos estudantes.

Rejeição aos políticos e venda de voto

A decepção com os “representantes do povo” é grande, pois 68,7% concordam parcial (38,46%) ou totalmente (30,24%) que “os políticos são todos corruptos”. Corrupção, entretanto, que não encontra grandes barreiras entre 19,8% dos pesquisados, pois 14,2% concordam totalmente e 5,6% parcialmente com a frase: “Venderia meu voto por R$ 1 mil”.

A grande maioria dos alunos não acredita que os políticos representam bem a sociedade. As porcentagens que indicam essa descrença são significativas no que diz respeito a senadores (75,4%), deputados federais (74,3%), deputados estaduais (74,7%), vereadores (67,3%), governador (77,8%) e, sobretudo, presidente da República (81,8%).

Como reflexo da ausência de vida cívica e de compreensão das balizas mínimas para vida em sociedade, o procurador Armando Sobreiro aponta o alto percentual (14,17%) de afirmações admitindo a venda do voto por R$ 1.000,00, sendo que 5,62% ainda ficaram em dúvida. “Isso revela que a compreensão da dimensão real da corrupção não é alcançada, já que limitada pelos efeitos da cultura da ‘vantagem’ e da ‘esperteza’. Não há compreensão, por parte de boa parcela dos jovens entrevistados, de que a vantagem indevida recebida em disputa eleitoral vai custar muito caro quando os políticos corruptos assumires o poder”, disse.

Armando Sobreiro também apontou aspectos positivos na pesquisa, como a indicação de que 53% dos entrevistados entendem que a educação política deveria estar presente nas escolas, muito embora se perceba resistência de 11%.

O que é Constituição? O que faz um deputado estadual?

As respostas a questões ligadas à cidadania e à representação política mostram notável desconhecimento quanto ao funcionamento das instituições. Responderam não saber o que é a Constituição Federal 41,2% dos alunos. E o que faz um deputado estadual? 41% dos estudantes não sabem, assim como 33% não têm ideia do que faz um juiz de Direito, e 39,3% dizem o mesmo do Ministério Público.

Manifestações

Embora talvez possa haver certo senso comum que relaciona os jovens à maciça participação em manifestações e passeatas, ao menos entre os quase 11 mil alunos das escolas pesquisadas, essa ideia não se confirma, pois 56% jamais estiveram nesses movimentos. Disseram que foram algumas vezes, 38% dos entrevistados e apenas 5,9% declararam participar ativamente. Além disso, apenas 37,7% dos entrevistados disseram ter interesse na política.

Apesar dessa baixíssima participação dos respondentes nessas atividades, a pesquisa aponta para um maior desejo nesse sentido. Mais de 80% dos alunos acreditam que a educação política deveria estar presente nas escolas.

Voto aos 16 anos e serviços públicos

Mesmo diante da escassa participação nas ações coletivas, os estudantes pensam que o jovem de 16 anos está preparado para votar: 37,6% acham que sim, e 26,15% concordam parcialmente. 36,3% dos pesquisados, por sua vez, creem (parcial ou totalmente) que o adolescente de 16 anos não tem preparação suficiente para exercer o direito/dever do voto. Direito, aliás, que eles defendem que seja mantido como obrigação legal: 41,2% concordam totalmente e 18,2% parcialmente com a obrigatoriedade do voto. Contraditoriamente, apenas 33% dos pesquisados com idade entre 16 e 18 anos disseram já ter feito o título de eleitor.

Os jovens elegeram como problemas mais graves nos seus municípios a saúde (26,2%), a segurança (16,3%), o desemprego (15,9%), o saneamento básico (15,5%) e a educação (10,5%). Outro indicador interessante é que mais de um terço dos estudantes (34,3%) diz colaborar com a renda familiar.

Passividade

O promotor de Justiça Eduardo Cambi, coordenador do Geração Atitude, viu o resultado da pesquisa com preocupação, especialmente no que se refere à passividade revelada pelos estudantes. “Eles acreditam que a corrupção é um dos grandes problemas do país e que os políticos não representam adequadamente a sociedade, mas não tomam atitudes para mudar esse quadro. São pouquíssimos os que têm interesse pela política e que participam de atividades de cidadania, dentro ou fora da escola. Ou seja, os jovens acreditam que a situação está ruim, mas pouco ou nada fazem para mudá-la e parecem não acreditar na força da participação popular”, lamenta Cambi.

O promotor também acredita que o retrato encontrado nas instituições de ensino é um espelho da sociedade. Visitando escolas nas ações do programa, especialmente à noite, diz ter encontrado muitos alunos que trabalham de dia e chegam cansados à sala de aula, bem como professores desmotivados. “É preciso fazer algo para mudar o cenário cinza de algumas escolas”, afirma, acreditando que o incentivo ao exercício da cidadania pode ajudar a alterar esse quadro. “A escola pode se aproximar mais dos problemas sociais e, ao invés de trabalhar com temas abstratos, ensinar, por exemplo, os alunos a usarem a Lei de Acesso a Informação e a fiscalizarem os portais da transparência. Por sua vez, os estudantes, ao participarem dos grêmios estudantis, dos conselhos escolares ou de outros espaços democráticos, deveriam contribuir com a gestão da escola, além de cobrar os diretores das instituições de ensino para que prestem contas de suas atuações e do uso do dinheiro público. Tais iniciativas poderiam melhorar o próprio ambiente escolar, refletir na qualidade do ensino e expandir para fora das escolas, atingindo os pais dos alunos e outros cidadãos que vierem a ser incentivados a participar de audiências públicas, associações de bairros, observatórios sociais, reuniões de conselhos de direitos, associarem-se a partidos políticos… enfim a lutarem por seus direitos e por uma sociedade mais ética e justa”, sugeriu.

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