Fazenda Rio Grande deve ter devolução de R$ 2,7 milhões de parceria com Oscip

TCE-PR julga irregular prestação de contas de transferência ao Instituto Confiancce, por falta de documentos e terceirização indevida de serviços públicos, entre outras impropriedades. Cabe recurso

O Instituto Confiancce, a ex-presidente da entidade Cláudia Aparecida Gali, e o ex-prefeito de Fazenda Rio Grande Antônio Wandscheer (gestão 2005-2008) deverão restituir, de forma solidária, a soma de R$ 2.687.685,85 ao cofre do município de Fazenda Rio Grande. O valor deverá ser corrigido monetariamente e calculado após o trânsito em julgado da decisão, da qual cabe recurso.

As contas de 2008 de parceria celebrada entre a organização da sociedade civil de interesse público (Oscip) Instituto Confiancce e o Município de Fazenda Rio Grande foram julgadas irregulares pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR). O objeto da transferência voluntária era a execução de serviços de apoio na área de saúde pública municipal.

Em virtude das irregularidades, o Tribunal determinou a aplicação de quatro multas de R$ 1.450,98 ao ex-prefeito responsável, totalizando R$ 5.803,02; e de três multas do mesmo valor à presidente da Oscip à época, que somam R$ 4.352,94. As sanções estão previstas no artigo 87, IV, da Lei Orgânica do TCE (Lei Complementar Estadual nº 113/2005).

Os conselheiros determinaram, ainda, a inclusão dos nomes de Antônio Wandscheer e Cláudia Aparecida Gali no cadastro de responsáveis com contas irregulares.

As razões para a desaprovação foram a utilização indevida de contrato comercial em detrimento de Termo de Parceria; a terceirização de serviço público de saúde para entidade privada, sem a existência de complementariedade e em burla ao devido procedimento licitatório; a terceirização indevida de outros serviços públicos, que resultou em despesas sem licitação e em contratação de pessoal sem concurso público; e a contratação de agentes comunitários de saúde e agentes de endemias por meio das parcerias.

Também foram julgadas irregulares a falta das informações financeiras referentes ao Termo de Parceria nº 47/2008; dos relatórios de execução e dos demais documentos necessários à validação da movimentação financeira e das despesas informadas; dos Termos de Cumprimento dos Objetivos referentes aos Termos de Parceria nº 38/2008 e nº 161/2008; e da comprovação do saldo final do convênio.

Instrução do processo

A Coordenadoria de Fiscalização de Transferências e Contratos (Cofit) afirmou que houve a utilização indevida de contrato comercial em detrimento de Termo de Parceria, em prejuízo à transparência e ao controle na execução do convênio, pois o termo obrigaria a prestação de contas integral dos recursos repassados, o que não ocorre em relação aos contratos comerciais.

A unidade técnica ressaltou, ainda, que ocorreu terceirização de serviço público de saúde para entidade privada, sem a existência de complementariedade e em burla ao devido procedimento licitatório, pois a Oscip executou vários programas de políticas públicas nas áreas de saúde, a manutenção de um hospital e a contratação de pessoal, serviços típicos da atividade municipal.

A Cofit também apontou que houve a realização de despesas sem licitação e contratação de pessoal sem concurso público, por parte do município; e contratação de agentes comunitários de saúde e agentes de endemias, por meio das parcerias. E sustentou que a falta de contratação pelo município dos empregados envolvidos afetou o índice de pessoal, pois os valores pagos à tomadora foram lançados como “Serviços de Terceiros – Pessoa Jurídica”.

Além disso, os técnicos do TCE-PR ressaltaram que há funcionários no quadro de pessoal do município cuja natureza dos serviços prestados é compatível com aqueles executados pela Oscip contratada.

Sobre o limite de gastos com pessoal estabelecidos pela Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF), a unidade técnica acrescentou que se os valores repassados à Oscip no exercício de 2008 – R$ 2.626.282,41 – tivessem sido registrados como “Despesas de Pessoal”, o novo índice obtido seria de 48,74% e, consequentemente, o município receberia alerta por já ter utilizado 90,26% do índice total estabelecido pela LRF.

Quanto à alteração de valores, a Cofit destacou que em 2008 foi homologada e registrada no Sistema de Informações Municipais-Acompanhamento Mensal (SIM-AM) a quantia de R$ 485.087,20, mas ocorreram mudanças de valores que chegaram a R$ 1.728.737,32, de modo que se nota um acréscimo de mais de 71,94% do valor inicial.

Assim, a unidade técnica opinou pela irregularidade das contas, com aplicação de sanções. O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou com a Cofit.

Decisão

Ao fundamentar seu voto, o relator do processo, conselheiro Artagão de Mattos Leão, afirmou que, efetivamente, houve deficiência no procedimento de escolha do Instituto Confiancce e que há fortes indícios de direcionamento na seleção do vencedor da licitação.

Artagão ressaltou que a celebração de contrato comercial desvirtua a relação jurídica estabelecida entre a administração pública e a Oscip, pois trata-se de uma parceria, a qual se submete às disposições da Lei Federal nº 9.790/99 e do Decreto nº 3.100/99, principalmente em relação à obrigatoriedade da prestação de contas. Ele declarou que, assim, houve afronta ao estabelecido nos artigos 37, 175 e 196 da Constituição Federal e ao disposto nos artigos 167 e 168 da Constituição Estadual do Paraná.

O conselheiro destacou que houve evidente terceirização de serviço público de saúde para entidade privada, sem a existência de complementariedade e em burla ao devido procedimento licitatório.

O relator frisou que a terceirização de contratação utilizada pelas partes interferiu diretamente no índice de gastos de pessoal, que seria afetado de maneira significativa se estas atividades tivessem sido desenvolvidas pelo município, em clara ofensa às disposições da Constituição e da LRF.

Artagão lembrou, ainda, que a utilização do terceiro setor no atendimento de atividades essenciais de saúde, por intermédio de entidades privadas, na maior parte dos casos evidencia uma terceirização de mão de obra e um mascaramento do real índice de despesas com pessoal.

Finalmente, o conselheiro afirmou que foram celebrados três contratos, mas só foram enviados demonstrativos financeiros de dois deles, faltando as informações necessárias sobre o Termo de Parceria nº 47/08.

Os conselheiros aprovaram, por unanimidade, o voto do relator, na sessão de 29 de agosto da Segunda Câmara. Os prazos para recursos passaram a contar em 4 de setembro, primeiro dia útil após a publicação do  Acórdão nº 2301/18 – Segunda Câmara, na edição nº 1.900 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC). 

Serviço

Processo : 190321/09
Acórdão nº 2301/18 – Segunda Câmara
Assunto: Prestação de Contas de Transferência
Entidade: Instituto Confiancce
Interessados: Município de Fazenda Rio Grande, Antônio Wandscheer e Cláudia Aparecida Gali
Relator: Conselheiro Artagão de Mattos Leão

 

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