Sob intervenção, Rio tem queda em roubo de carga, mas sofre com tiroteios

Por Roberta Jansen / Estadão Conteúdo

A intervenção na segurança do Rio completa dez meses no domingo, 16, com um saldo pouco otimista. Anunciada em março como a solução possível para deter a escalada da violência na região metropolitana, a ação federal conseguiu uma redução de 14,4% no roubo de cargas, mas a um custo alto: os registros de tiroteios cresceram 56% e o número de pessoas mortas pela polícia aumentou nada menos que 40% em relação ao mesmo período do ano anterior. Em 303 dias, 161 pessoas foram atingidas por balas perdidas.

Os dados foram divulgados neste sábado, 15, pelo Observatório da Intervenção, formado por especialistas em violência e segurança pública da Universidade Cândido Mendes. Ao longo dos dez meses da iniciativa, o observatório monitorou mensalmente 15 indicadores. “A intervenção federal pelas Forças Armadas não resolveu os problemas estruturais da segurança pública do Rio”, concluiu o relatório. “O que vimos foi a reafirmação da estratégia de confrontos armados, gastos concentrados em grandes operações e ausência de uma reforma estrutural da política de segurança.”

De acordo com o cientista político Pablo Nunes, que participou da elaboração do levantamento, o investimento em operações militares ostensivas pode ter um efeito positivo a curto prazo, mas não é sustentável.

Os números mostram que, entre fevereiro e dezembro deste ano, houve uma redução de 5,5% nos números de homicídios dolosos em relação ao mesmo período do ano passado e de 14,4% do roubo de carga – um problema que estava inviabilizando a economia do Estado.

Durante a intervenção, o número de agentes de segurança feridos em operações foi de 92 – 15% a menos que os 108 registrados no mesmo período do ano anterior. O número de agentes feridos também caiu um pouco, de 200 para 180.

No entanto, dispararam o número de tiroteios (8.193 contra 5 238) e de mortos pela polícia (um total de 204 durante a intervenção). Nos dez meses da intervenção, 161 pessoas foram vítimas de bala perdida; praticamente uma a cada dois dias.

“Houve uma pequena redução nos índices de homicídio, que eu chamaria de oscilação, e um aumento assustador do número de pessoas mortas pela polícia, uma situação que não é combatida pela intervenção”, avaliou Nunes. “Ainda estamos esperando os números de dezembro, mas tudo indica que o número de roubo de cargas volta a subir.”

A socióloga Maria Isabel Couto, do laboratório de dados sobre violência urbana Fogo Cruzado, concorda com o colega.

“Consistentemente, todos os relatórios que lançamos mostram um aumento da violência armada durante a intervenção”, afirma. “Isso significa que a própria política de segurança tem um impacto grande na violência armada. É um efeito claro do aumento das operações grandes e com muitos agentes.”

Segundo Maria Isabel, eventualmente, pode haver a redução de alguns índices. Mas o impacto sobre o dia a dia da população – sobretudo de áreas mais carentes – é cada vez maior.

“A violência por arma de fogo afeta a população de forma muito ampla: é o trem que fica sem circular, a escola que é fechada, o posto de saúde que não abre. São várias pessoas que não conseguem sair de casa para ir trabalhar, outras que são baleadas dentro do transporte público, por exemplo”, explica Maria Isabel. “Começamos a medir os tiroteios contínuos, aqueles que duram mais de duas horas. No total, durante a intervenção, foram mais de 260 horas de tiros; teve tiroteio contínuo que durou mais de 24 horas.”

Em nota oficial, o Gabinete da Intervenção Federal (GIF) afirmou que os empenhos financeiros para a área de segurança pública alcançam 62,9% dos recursos de R$ 1,2 bilhão destinados pelo governo federal. Ainda segundo a nota, o valor comprometido com compras já chega a R$ 755 milhões. Estão sendo adquiridos desde veículos até colchões para as polícias militar e civil.

“Estes recursos que já foram empenhados superam os valores de dois anos e meio de investimento do estado do Rio em segurança pública”, afirmou o secretário de administração do GIF, general Laélio Andrade.

O GIF informou ainda que, para comentários sobre os índices de violência, o jornal deveria procurar a Secretaria de Segurança, que não respondeu à solicitação. A intervenção está prevista para terminar no dia 31 de dezembro.

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