‘Fiquei três horas no escuro com água no pescoço’, diz sobrevivente de enxurrada

Por Julia Affonso/Estadão Conteúdo  

Pouco mais de um mês após o temporal que deixou sete mortos, no Rio, a doméstica Maria do Carmo Nascimento Santos, de 59 anos – uma sobrevivente da enxurrada -, ainda acorda no meio da madrugada, assustada, nervosa. Na noite de 6 de fevereiro, ela estava em casa, no Vidigal, zona sul da cidade, quando um mar de lama arrebentou a janela da sala e invadiu o imóvel.

Maria perdeu tudo o que estava na casa em que morava havia mais de 20 anos na região da Jaqueira, no pé do Morro Dois Irmãos. A mobília, as roupas, os documentos, seu dinheiro e até sua cachorrinha Lupita, de nove meses. Só ela se salvou.

“A água já veio me carregando para a cozinha. Eu fiquei com a água até o pescoço”, relata. “Não deu tempo de salvar a Lupita. Eu fiquei lá mais de 3 horas no escuro. Eu fiquei com a cabeça no teto para não engolir aquela sujeira”, contou.

Desde que a lama quase tirou sua vida, Maria está morando na casa onde trabalha. Amigos estão fazendo uma vaquinha para ajudá-la a reconstruir a vida.

“Quando eu vim para o Rio, eu estava com 28 anos. Hoje eu estou com 59, vou fazer 60 este ano”, conta Maria, que nasceu em Belmonte, cidade de 23 mil habitantes no sul da Bahia. “Sempre trabalhei para ter minha casa. Eu arrumava tudo direitinho, recebia meus amigos. A gente está correndo atrás para ver o que vai conseguir.”

“Às vezes, eu já estou deitada e acordo lembrando. Quero abrir a porta e sair correndo. É um trauma. Ainda estou me acalmando aos poucos, fico muito nervosa. Eu acho que tinha uns 22 anos nessa casa. Sempre (morei) sozinha.”

“Há nove meses tinha a Lupita. Achei esse nome bonito e botei nela. Eu sempre quis ter cachorro, mas não tinha condições de criar. Ela era bebê, cor bege e tinha uns 8 quilos. Dormia comigo no quarto. Quando estava calor, eu botava ela na frente do ventilador. Ela gostava de comer pão, botava as patinhas no meu pé e comia”, contou.

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