A Revolução de 64 (I)

Foto: Reprodução

Por César Graça

Foi a última revolução que o Brasil viveu. Não foi a única. O Brasil viveu várias. Estamos, hoje, entrando numa fase de mais estabilidade. Agora, em 2021, estamos vivendo a transição de um ciclo de governos de esquerda para governos de direita. Esta transição começou em 2013, na Copa das Confederações. A troca de um ciclo de governos de direita para governos de esquerda, que ocorreu em 1986, já foi uma transição, que não é comum na História do Brasil. Duas mudanças de ciclo consecutivas, 1986 e 2019, sem revolução é algo inédito no Brasil. Equivalente à estabilidade do 2º Império com Pedro II.

A Revolução de 64 é um eco da Crise de 54, que levou ao suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954. O Brasil viveu grandes transformações na Era Vargas (1930 – 1954). A maior delas foi o crescimento econômico das pessoas mais pobres.

No início, de 1500 a 1800, a estrutura indígena foi muito forte. Desde o início, o brasileiro foi muito diferente do português. Com a chegada da família real português em 1808, o Brasil começa com o processo de independência de Portugal, que vai acontecer em 1822. No ano que vem, Brasil faz dois séculos da independência de Portugal. A independência foi um processo suave. O Brasil troca a monarquia portuguesa por uma monarquia brasileira. Faz parte da cultura brasileira que a elite econômica não precise cumprir as leis. Um traço disso é o foro privilegiado. Um ranço do período colonial português, que existe, no Brasil, até hoje.

Na época da chegada da família real portuguesa, a elite econômica brasileira era liderada pelos traficantes de escravos. Traficar escravos era a atividade mais lucrativa no Brasil Colonial. Para conseguir recursos Dom João VI distribuía títulos aristocráticos aos traficantes mais ricos. Foi por esse motivo que o Brasil demorou tanto para a libertação dos escravos.

A Proclamação da República aconteceu quase ao mesmo tempo da liberação dos escravos em 1889. Foi uma reação dos grandes fazendeiros contra o último ato da monarquia. Poucas pessoas participaram da Proclamação. A maioria dos brasileiros acreditava que estava ocorrendo mais uma queda de gabinete, aliás, como era muito comum na monarquia brasileira. Só com o tempo é que os brasileiros tomaram conta que tinham mudado de regime.

A independência foi um movimento orquestrado pela Maçonaria. A República foi pelo positivismo e pelo Exército Brasileiro. Foram movimentos liderados por pequenos grupos com ideias novas. Reações sempre houve, mas foram contidas. Às vezes com a força, outras com pacificação. Algumas, com as duas. Os dois movimentos se concentraram nas elites. A população quase não participou. Assistiu.

A Revolução de 30 foi um pouco diferente. Houve uma grande mobilização. O pano de fundo foi o sistema de eleições a bico de pena. Não havia ainda o voto secreto. Tudo era feito em cima de listas. As fraudes eram muito comuns. Os candidatos eram escolhidos pelas lideranças políticas. O presidente da república escolhia o candidato numa consulta indireta aos presidentes de província, governadores. Uma vez era de Minas Gerais, a seguinte de São Paulo. Em 30, a alternância é quebrada. São Paulo indica um candidato de São Paulo. Abertamente a Paraíba discorda da escolha do candidato a presidente feita pelo presidente em exercício, que era de São Paulo.  Os mineiros não gostaram. Era a sua vez. Getúlio Vargas, do Rio Grande do Sul, lança a sua candidatura. Minas e a Paraíba o apoiam. O candidato de São Paulo ganha. Getúlio denuncia as fraudes. Que eram muito comuns, de ambas as partes. Parecia tudo decidido. De repente o presidente da Província da Paraíba é assassinado. Existe duas versões: crime passional ou vingança política. Ambas, possíveis. Getúlio infla uma revolta. Mobiliza as forças armadas do Rio Grande do Sul, a Brigada Militar. Que inicia a revolta atacando as forças do Exército Brasileiro no Rio Grande do Sul em 3 de outubro de 1930. Neutralizando-as em poucas horas. As tropas do Rio Grande do Sul tomam o caminho de São Paulo. A grande questão era como São Paulo se comportaria. Era esperada uma grande batalha entre São Paulo e Paraná, na cidade de Itararé. No último momento, os paulistas recuaram e não houve luta. A revolução avançou com as suas tropas e assumiu o poder no Rio de Janeiro. E se autointitulou governo provisório. Começou uma nova fase na política brasileira, que foi até o suicídio de Vargas em 1954. Em 24 anos o Brasil mudou completamente.

Do suicídio de Vargas até a Revolução de 64 foi um período de transição. Muito estranho por sinal. O melhor e o pior aconteceram neste período. O melhor foi o governo de Juscelino Kubitschek. O melhor presidente que o Brasil já teve. Foi um período de grandes liberdades e grande crescimento econômico. Foi um período ímpar.

O pior foi o período seguinte. Se iniciou com a eleição de Jânio Quadros, um populista que tenta dar um golpe com a sua renúncia. O golpe não dá certo. O Congresso aceita a sua renúncia. O vice-presidente era João Goulart. Um ex-ministro de Getúlio Vargas com profundas raízes no movimento de esquerda. As forças armadas se opõem à posse de Goulart. Depois de vários acordos, ele assume.

É um momento crítico da Guerra Fria, Estados Unidos contra a União Soviética. Fidel Castro, 1960, faz uma revolução e assume o poder em Cuba e instala mísseis soviéticos, em 1962, com armas nucleares. O mundo vive quase uma guerra nuclear. Os russos dão um passo atrás e tiram os mísseis de Cuba.

O presidente dos Estados Unidos é John Kennedy, que receia que o mesmo aconteça com o Brasil. Começa um período de forte interferência dos norte-americanos na política interna brasileira. Chegam a financiar diretamente candidatos ao Congresso Nacional, mas não conseguem controlar a situação. O presidente Kennedy é assassinato em novembro de 1963. Assume o vice Lyndon Johnson. É um momento de grande instabilidade na política norte-americana.

Os norte-americanos se desesperam e mandam um força tarefa, com porta-aviões, para invadir o Brasil. As forças armadas brasileiras se desesperam e dão um golpe militar e derrubam o presidente João Goulart, para evitar a invasão norte-americana. No meio do caminho, a força tarefa dá meia volta, quando vê que a situação política brasileira mudou ao seu favor.

A Revolução de 64 começa estabanada.  O general Mourão Filho, deslocou as tropas que comandava, em Juiz de Fora, em direção ao Rio de Janeiro. Pegou todo o mundo desprevenido. João Goulart e todo o comando da Revolução. É provável que já estivesse sabendo das intensões dos norte-americanos invadirem o Brasil. João Goulart também já estava sabendo das intensões dos norte-americanos. Já tinha sido ameaçado pelos norte-americanos. Não resiste ao avanço das tropas revoltosas de Minas. Um grande contingente de tropas, que estavam na Vila Militar, em Deodoro, na cidade do Rio de Janeiro, ainda não tinha se rebelada e continuava fiel ao seu Ministro da Guerra. Mas Goulart resolve não resistir e se refugia no Uruguai. O que desmobiliza os seus aliados, facilita muito os primeiros passos da Revolução e desarma a invasão dos norte-americanos.

A Revolução já estava sendo preparada. O seu comandante seria o Marechal Castelo Branco, que adota uma atitude conciliadora. Pede para ser reconhecido como presidente na ausência do presidente Goulart. O Congresso Nacional vota essa medida. Logo em seguida os Estados Unidos reconheceram o novo governo. Esse é um fato que as esquerdas brasileiras fazem questão de esquecer.

Depois dos Estados Unidos, outras nações também reconhecem o novo governo brasileiro. O projeto de reconstrução do Brasil, depois de quatro anos de governos de esquerda, já estava pronto. Os militares sabiam o que deveria ser feito. Foram dois anos de trabalhos intensos: controle da inflação, reconstrução da estrutura do Estado etc. Logo o Brasil voltava a crescer.

Essa quase invasão dos Estados Unidos é um tabu dos nossos historiadores e das nossas Forças Armadas. Ninguém quer citar. Mostra a vulnerabilidade do Brasil. E como nos momentos mais difíceis os norte-americanos estão dispostos a tudo. Mesmo invadir os seus amigos. Em função disso, o Brasil reviu o seu relacionamento com os países mais desenvolvidos. A tendência foi a procura de uma posição mais equidistante. Esse pensamento marcou muito as nossas Forças Armadas, sempre procurando uma independência do Brasil das nações mais fortes.

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