O valor do dólar

Por César Graça

O dólar ultrapassou a barreira de 5,50 reais. É um marco na história recente. As oscilações no valor do dólar, no Brasil, são muito intensas. No final de 2002, ele chegou a quebrar a barreira de 4,00 reais. Parece pouco, mas corrigido pela inflação significa mais de 7,00 reais. Depois o dólar chegou a valer menos de 1,60 reais, quando o preço das commodities agrícolas disparou nos mercados internacionais em 2006. Ou seja, não é algo para se assustar. É preciso compreender que o dólar oscila bastante. Faz parte da estrutura dos países capitalistas. O interessante é observar o que essas oscilações provocam.

Com o dólar caro os exportadores ganham e os importadores perdem. Hoje o setor da nossa economia que mais está crescendo é a agroindústria. O nosso carro-chefe é a soja. A soja passou de 110 reais nos portos na semana passada. Para os agricultores, o marco de 100 reais é uma referência. Significa grandes lucros.

O Brasil é o maior produtor e exportador de soja do mundo. Em 2006, a liderança estava com os Estados Unidos. Hoje, os Estados Unidos ocupam a segunda colocação e está sofrendo uma grande crise na sua agricultura. Com o dólar muito valorizado eles estão perdendo dinheiro com os preços atuais de 8,50 dólares o bush (unidade americana de medida, vale um pouco mais de 27 kg) da soja.

A agricultura deles está sobrevivendo graças aos massivos subsídios do governo. Sem eles simplesmente quebraria. Mesmo assim, muitos agricultores estão quebrados. Os bancos que atendem os agricultores estão em sérias dificuldades internados na UTI do FED (O Banco Central deles).

Na safra 2019-2020 o Brasil produziu 125 milhões de toneladas. É evidente que os agricultores brasileiros vão aumentar a produção de soja na próxima safra que se inicia em setembro. Uma estimativa é de um crescimento de 10 a 15 milhões de toneladas. Vai depender muito do clima. Pela vontade dos agricultores o Brasil vai dar um grande salto.

Mas não é só a soja que vai crescer, o milho também vai. No ano passado, o Brasil exportou 45 milhões de toneladas, tirando dos Estados Unidos a liderança mundial na exportação de milho. O que provocou um aumento nos preços internos do milho. A produção deste ano não deve aumentar muito, o clima não foi muito favorável ao milho. Por falta de chuva, o plantio da soja atrasou. O que levou a um atraso da sua colheita. Em consequência, o milho também foi plantado tarde. Em algumas regiões até não foi plantado, pois foi perdida a janela ideal do plantio. Em algumas localidades está chovendo pouco, o que está dificultando o desenvolvimento do milho e pondo em risco o aumento da produção. Só teremos uma boa ideia do tamanho da safra no final da colheita, lá em julho e agosto.

Com os preços da soja e do milho nas alturas, a próxima safra, que começa a ser plantada em setembro, deve ser muito concorrida. Se o clima ajudar será uma grande safra. Os investimentos vão aumentar. Como todo o resto da economia ainda está sentido os efeitos do Coronavírus não vão faltar recursos para a agricultura, principalmente financeiros. Todos os ventos estão favoráveis. Os estoques de passagem estarão muito baixos. Todo o ambiente concorre para um grande salto na produção agrícola e numa melhoria na nossa economia de exportação.

 

Essa euforia deve contaminar o Brasil inteiro. A agricultura deve puxar o setor industrial. Apesar da crise atual, o setor das máquinas agrícolas está crescendo. Com o plantio da próxima safra em setembro deve crescer muito mais.

Com o dólar caro as importações devem diminuir e a produção local aumentar. Muitos produtos importados ficarão muito caros e a produção nacional vai ficar mais vantajosa. O que vai provocar uma onda de investimentos na nossa indústria, que estava sofrendo bastante com a concorrência dos produtos importados. E o crescimento vai ser muito rápido pois a indústria, de uma forma geral, está com uma grande capacidade ociosa.

Mas não é só o mercado interno que será atraente para a indústria. Com o dólar muito caro as exportações ficam atraentes. Algumas indústrias já estão planejando a retomada da produção visando as exportações, mesmo antes de atender o mercado interno. É o caso da indústria automobilística. Com o dólar acima de 5,50 reais, os carros e caminhões produzidos no Brasil ficaram muito baratos. Como empresas automobilísticas são empresas internacionais, elas produzem aonde os custos são mais baratos e exportam para os outros países. Na América Latina, o México era o lugar aonde se produzia carros e caminhões mais baratos. O cliente principal dessa produção era os Estados Unidos. Agora o Brasil está mais competitivo. As exportações industriais devem aumentar para os Estados Unidos, em muitos segmentos o Brasil vai ser mais competitivo do que a China.

Em consequência do aumento das exportações, o superávit da balança comercial já está aumentando. Em abril o superávit passou de 6,7 bilhões de dólares. Em maio as previsões de superávit da balança comercial do ano já devem passar de 50 bilhões de dólares. O que deve dar um folego à economia. Todo esse clima de pessimismo com relação ao Brasil deve começar a mudar. No final do ano o cenário já deve ser outro.

A terceira frente de transformação é a automação no setor de serviços, que é o maior setor da nossa economia. A quarentena provocou profunda transformações no comportamento das pessoas. Um desses comportamentos foi o uso intensivo da internet para tudo. As compras pela internet deram um salto. Mesmo assim estamos muito atrasados com relação aos líderes como a Coréia do Sul e a China. Lá as lojas físicas já diminuíram bastante. A rede de distribuição dos produtos lá está muito eficiente. Na Coréia já acontece uma previsão dos horários de entrega. Compra-se á noite e de manhã cedo os produtos de supermercado já estão na porta de casa. Na China o uso de dinheiro está ficando muito raro. A maioria das transações já são pagas com celular. A internet deve se acelerar bastante no Brasil. A distância entre o Brasil e a Ásia no uso da internet e de outras tecnologias de ponta deve cair bastante.

Mesmo nas lojas físicas tradicionais o self-service deve aumentar bastante. Os postos de combustíveis serão os primeiros a adorarem o self-service. Mesmo os supermercados tradicionais terão o self-service. Em Curitiba as primeiras experiencias já estão funcionando. A redução do tempo de permanência e os preços mais baixos serão os grandes atrativos destas lojas automatizadas.

No Japão a proliferação de máquinas de autoatendimento é enorme. Já existem lojas, principalmente de fast food, que só usam máquinas. Na Europa o uso de máquinas de autoatendimento em hotéis é muito frequente. Em alguns até a recepção já está totalmente automatizada há muito tempo.

O choque da automação na área de serviços será muito intenso. O aumento do salário das pessoas que trabalham na área de serviços será o grande motivador. Locais de atendimento personalizado serão raros. E os serviços e produtos, bem mais caros.

O dólar alto e a quarentena vão dar um grande impulso na automação do Brasil. Essa transformação vai ser muito rápida. Em poucos anos o Brasil vai ser totalmente diferente. Por outro lado, o aumento dos superávits comerciais vai trazer um período de estabilidade à economia brasileira.

A crise que estamos passando demonstrou o quanto importante é ter reservas. Os países que não têm reservas vão sofrer muito mais. Um exemplo é a Argentina, que deve passar, mais uma vez, um bom tempo longo do mercado financeiro internacional.

Passados esses momentos mais críticos do Coronavírus e as brigas do Congresso com o presidente Bolsonaro, uma nova realidade econômica e política vai emergir, fruto de uma estratégia do governo Bolsonaro de manter o real desvalorizado.

Em outros momentos a desvalorização do real foi atacada pelo presidente Trump, pois o Brasil fazia uma séria concorrência com a agricultura dos Estados Unidos. Neste momento essa estratégia passa desapercebida. Trump tem outras coisas para se preocupar.

A desvalorização real vai levar a uma recuperação bem mais rápida da economia brasileira. Logo vamos observar uma recuperação da indústria. Em seguida uma recuperação da área de serviços. Algo que ninguém tinha previsto. O Brasil vai se recuperar da crise bem antes que as pessoas e os economistas imaginam.

 

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