Linha Verde ou Linha Maginot

Ônibus Ligeirão na Linha Verde. Foto: Pedro Ribas/SMCS

Por César Graça

Se existe um assunto que todos os curitibanos concordam é a lentidão da construção da Linha Verde. É um grande exemplo de como as coisas não devem ser feitas. Para quem precisa usá-la é um martírio diário. Para os administradores públicos resta a oportunidade de recuperar a credibilidade perdida. O passado é o passado. Aprender com os próprios erros, uma necessidade.

A Linha Verde nasceu no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPUC) há mais de 30 anos. Era o principal projeto do ex-prefeito Cassio Taniguchi na sua campanha para prefeito em 1996. Durante os seus dois mandatos 1997- 2004, a obra não saiu do papel. Ela começou a ser construída pelo ex-prefeito Beto Richa em 2005. De lá para cá, a obra passou por diversos prefeitos e ainda continua inacabada. São mais de 16 anos de construção e muito desconforto para os moradores da Região Metropolitana de Curitiba (RMC). E ainda não tem data de término.

A Linha Maginot foi uma linha defensiva construída pela França de 1930 a 1936 entre a França e a Alemanha. A ideia era que fosse uma barreira intransponível para os exércitos alemães. Só que os alemães contornaram a Linha Maginot e em seis semanas, depois do início da guerra, estavam desfilando na avenida Champs-Élysées, em Paris. A Linha Maginot foi concebida para as guerras de trincheiras, comuns na 1ª Guerra Mundial. Os alemães criaram uma nova estratégia de guerra, a guerra relâmpago, com concentração de tanques em pontos de ataque. A 2ª Guerra Mundial foi totalmente diferente da 1ª. A concepção da Linha Maginot foi totalmente anacrônica. Foi criada para um tipo de guerra que não existia mais.

A concepção original da Linha Verde foi para a implantação de um veículo leve sobre trilhos (VLT), modelo muito comum na Europa, principalmente na França, no final do século XX. O Rio de Janeiro implantou esse modelo de transporte num pequeno trecho no centro da cidade para os Jogos Olímpicos. Com o tempo o projeto da Linha Verde mudou para os ônibus expressos em canaletas. Depois evoluiu para a concepção do ligeirão. É o modelo atualmente em construção.

É preciso terminar a Linha Verde. Soluções alternativas já podem ser implantadas para colher alguns resultados. Ela já está operacional do Pinheirinho até a estação Fagundes Varela, no Bairro Alto. Uma ligação com os terminais Santa Cândida e Maracanã seria um grande avanço. Isso poderia ser feito hoje com os ônibus ligeirinho. É uma solução simples e rápida. Disponibilizaria uma interligação rápida entre a zona norte com a zona sul. Enquanto o trecho entre o Atuba e a Fagundes Varela está em construção.

O segundo ponto seria a integração das diversas linhas de ligeirão. A Linha Verde cruza a Marechal Floriano, na qual passa o ligeirão Boqueirão – Praça Carlos Gomes. Uma integração entre as duas linhas é essencial, pois daria uma grande mobilidade. Outra integração seria entre a linha norte-sul do ligeirão que passa pelo centro de Curitiba, Santa Cândida – Pinheirinho, e a mesma Boqueirão – Carlos Gomes, em frente ao Shopping Estação. E por aí vai.

Poder-se-ia fazer várias linhas de ligeirão numa mesma canaleta. Uma que fosse totalmente direta entre as estações finais, por exemplo: Pinheirinho – Santa Cândida, pela Linha Verde, sem nenhuma parada intermediária. Uma segunda com poucas paradas. E uma terceira parando em todas as estações. Com o uso, a demanda vai variar e ajustes poderiam ser feitos, otimizando o seu funcionamento.

Uma rede de ligeirões interligados poderia fazer o papel de uma rede de metrô com muitas vantagens. Seria muito mais flexível e bem mais barata de implantar e de operar. E poderia ser rapidamente implementada. Com as linhas de ligeirões diretos, a integração das cidades da Região Metropolitana de Curitiba poderia ser facilmente implementada. Seriam linhas com grande capacidade de transporte e com muita rapidez. Diversos tamanhos de ônibus poderiam ser utilizados, se adaptando às variações de demanda. Algo que não é possível fazer com as linhas de metrô. Se poderia criar linhas que funcionariam só de madrugada, usando as canaletas e as estações de conexão. Algo que também não é possível fazer com as linhas de metrô.

Com essa concepção, novas estações de integração precisariam ser reavaliadas. Um exemplo seria o cruzamento da Linha Verde com a Victor do Amaral. Esse é um ponto que pede uma estação de conexão.  Com esse conceito toda a Linha Verde precisaria ser refeita. Por outro lado, o sistema de transporte público da RMC daria um grande salto. A velocidade das linhas longas aumentaria muito. A integração com as linhas curtas ficaria facilitada, pois se poderia usar a estrutura atual. Poder-se-ia fazer várias inovações: um transporte muito eficiente de madrugada, novas linhas com micro-ônibus poder-se-iam ser criadas, o custo operacional seria reduzido etc. O resultado seria um salto de qualidade no transporte público da RMC. O custo das obras não seria muito grande, quando comparado à criação de um sistema de metrô.

Com a desativação dos trens cargueiros que atravessam a RMG, novas linhas poderiam ser criadas, ou mesmo o VLT poderia ser repensado nessas linhas desativadas. Logo teremos ônibus elétricos com baterias. O sistema poderia ser facilmente adaptado. Hoje o desafio dos ônibus elétricos a baterias é o custo das baterias. Nos últimos anos esse custo tem caído rapidamente. De repente se torna viável trocar a maioria dos ônibus a combustão por ônibus elétricos a bateria. O sistema seria bem simples de implantar e, principalmente, fácil de fazer melhorias, com custo operacional muito mais baixo.

Não ter embarcado na implementação de uma rede de metrô foi uma alternativa muito proveitosa para a RMC. O custo de uma boa rede de metrô é muito alto. Uma rede de ônibus elétricos a bateria é muito mais barata e rápida de implementar. Enquanto isso, é possível fazer uma solução ponte com os ônibus tradicionais ou híbridos. Com a solução de vários tipos de ônibus, com modalidade de funcionamento diferente e tamanhos diferentes, andando na mesma canaleta, o sistema de transporte público na RMC ganha uma grande flexibilidade.

Agora é o momento de atualizar os projetos para essa nova realidade e acelerar as obras. A vantagem é que o custo das obras é baixo, quando comparado com um sistema de metrô, e os resultados imediatos. Com um custo operacional menor, o preço das passagens de ônibus pode ser reduzido. O que é estímulo eleitoral para os atuais administradores. A RMC está com um preço de passagem muito alto. O que acelera a perda de passageiros. Uma redução do preço da tarifa vai ter um grande impacto para todo o sistema de transporte, atraindo passageiros.

Nos últimos tempos o preço do combustível estava muito baixo o que estimulava o transporte em carros e motocicletas. O que provocou uma grande evasão de passageiros do transporte público da RMC. Com a subida do preço dos combustíveis essa realidade mudou. O que ficou faltando é ampliar mais ainda mais o uso das atuais vias de transporte público. Para complementar, é preciso voltar a incentivar o uso de bicicletas em toda a RMC.

Uma das grandes virtudes do governo do presidente Bolsonaro é pegar obras inacabadas e terminá-las. E o povo está reconhecendo. Principalmente a população do Nordeste. Por que será que os curitibanos não podem ver a Linha Verde terminada? Quando mesmo a transposição do rio São Francisco já foi terminada. O que é um marco para o Brasil inteiro. Obra que foi anunciada pelo Imperador D. Pedro II. Iniciada pelo ex-presidente Lula e terminada pelo presidente Bolsonaro.

Uma forma de facilitar o término da Linha Verde é ampliar o seu uso. É preciso que mais pessoas comecem a usar a Linha Verde. A construção de várias novas estações de conexão ao longo da Linha Verde vai dar um novo dinamismo à obra. Com um bom sistema de transporte público, até o setor privado vai investir mais, ao longo da Linha Verde, gerando mais empregos num local que terá um sistema de transporte público eficiente. O que vai desengarrafar o tradicional centro de Curitiba. O eixo de crescimento de Curitiba será a Linha Verde. O que facilita até o acesso dos moradores da RMC à Curitiba.

Outro ponto importante é o acesso ao transporte público de qualidade. Com um bom sistema de transporte público, baseado em ônibus, todas as pessoas terão um acesso privilegiado. Com um sistema de metrô só parte da população tem acesso a um sistema de transporte de qualidade. Fazendo os ônibus andarem com mais velocidade, todos terão um acesso a todos os pontos da RMC facilitado. Principalmente aos que tiverem acesso às rotas de ligeirão. Que poderão ter, algumas linhas, com médias de velocidade acima dos 40 km/hora. Muito acima dos automóveis em vários lugares da RMC.

A definição das rotas de ônibus, principalmente dos ligeirões, será o ponto fundamental da reorganização do transporte público na RMC. A organização das linhas ponto a ponto é um atributo arcaico. Mas ainda muito aplicado. São linhas que tem origem em um bairro distante de alguma cidade da RMC e vão até o centro de Curitiba. É uma ligação radial bem ineficiente. Ainda existem por causa da tradição. Muitas dessas linhas estão totalmente segregadas do sistema de transporte público de Curitiba. Cobram tarifas diferenciadas e não permitem integração com o sistema de transporte público de Curitiba. São uma verdadeira aberração. O que demonstra uma grande deficiência de integração entre as cidades da RMC. Essa é uma das causas do alto custo do transporte público na RMC.

Todo o sistema de transporte público da RMC precisa ser repensado. Duas variáveis abrem grandes oportunidades: o sistema de ligeirões e os ônibus elétricos a bateria. Eram variáveis que não existiam há 30 anos. Os ligeirões foram uma descoberta na evolução dos ônibus expressos em canaletas. Demoraram para serem aceitos. A Prefeitura de Curitiba estava obcecada com o metrô e perdeu muito tempo antes de massificar essa solução simples e barata. A sua implantação na Linha Verde vai transformar o transporte na RMC. Os ônibus elétricos com baterias é uma consequência da evolução dos carros elétricos.

A Tesla revolucionou o mercado mundial de carros elétricos nos últimos 10 anos. Muito provavelmente vai lançar os primeiros caminhões elétricos no ano que vem. Logo em seguida virão os ônibus elétricos com baterias.

A China já tem uma indústria automobilística bastante grande de carros, caminhões e ônibus elétricos. Só que sua tecnologia ainda está bastante distante da Tesla. Mas isso é só uma condição de tempo. Logo teremos uma boa disponibilidade de ônibus elétricos a bateria no mundo inteiro.

Curitiba tem uma grande vantagem de ter um sistema único só baseado em ônibus a combustão. A conversão do sistema vai ser relativamente fácil. É possível avaliar uma tecnologia intermediária com ônibus flex e híbridos, construindo uma solução ponte. Algumas experiências já foram feitas, mas a tecnologia ainda não estava bem desenvolvida. É só uma questão de tempo.

Outro ponto importante, que vem com os ônibus com baterias elétricas é a direção autônoma. É uma funcionalidade que facilita muito a condução do motorista. Várias experiencias estão sendo feitas para não precisar mais de motoristas. Em algumas situações bem particulares isso já é possível. Um exemplo são grandes minas que usam poucos e grandes caminhões e outras máquinas.

Outra grande vantagem dos veículos elétricos com esse tipo de automação é gestão on-line de todo o sistema de transporte público da RMC, que pode passar de determinístico para probabilístico on-line. A capacidade pode ser ajustada à demanda a todo instante, em quantidade e tipo de ônibus em cada rota. O que deve abaixar muito o custo operacional do sistema. E qualquer instabilidade pode ser rapidamente corrigida. A expectativa de passagem dos ônibus nos pontos pode ser informada para os clientes pela internet em tempo real. Como já é feito em Seul, Coréia do Sul, há muito tempo.

Duas questões são decisivas na nova indústria automobilística de veículos elétricos: o custo das baterias e o desenvolvimento de softwares de condução autônoma. A Tesla está conseguindo grandes avanços nestas duas áreas. Isso vai chegar aos ônibus em um curto prazo. Existe uma grande oportunidade de adaptar o sistema de transporte público da RMC para esses avanços tecnológicos, que estão chegando. A integração dessas duas tecnologias ao transporte público da RMC será um grande salto de qualidade.

O resultado será um sistema simples, muito mais barato que os sistemas mistos com metrô, VLT e ônibus. Novamente Curitiba vai recuperar a liderança no desenvolvimento de sistemas de transporte público, construído uma solução inovadora. Como foi no início da década de 70.

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