Pós-crise

Foto: Pixabay

Por Cesar Graça

Tudo passa. As crises também. Por isso é importante se preparar para quando a crise terminar. Nada vai ser o mesmo. Isso é certo. É preciso se reinventar. Algumas lições foram aprendidas. A principal é o valor da vida. Algo que a nossa sociedade tinha esquecido. Se matava por questões banais. O respeito à vida é a primeira e mais importante das lições aprendidas. Os bens materiais perdidos são recuperáveis, a vida não. A prevenção é melhor que a correção, essa é a segunda lição. Não dá para deixar para amanhã o que pode ser feito hoje. É preciso ter reservas para as eventualidades. Poucas pessoas e mesmo empresas tinham reservas para eventualidades. Com o corpo humano acontece o mesmo, ele precisa estar com o seu sistema imunológico ativo, forte. Excessos o enfraquece. Alimentação saudável, exercícios físicos regulares e um equilíbrio emocional são fatores fundamentais. No entanto, a cultura social dominante é de excessos: de comida, de álcool, de emoções, de sexo e para alguns até drogas. Uma procura de intensidades que leva a uma fraqueza do corpo e o espírito.

Apesar dos vários erros cometidos, a sociedade brasileira começou bem cedo a se preparar para pandemia do Coronavírus. Ela chegou através das classes mais ricas que tinham viajado à Europa, o que fez o alarme da crise ecoar muito rapidamente. Os casos de contágio foram contados muito no início, as mortes também. O Brasil sabia que estava pouco preparado. O nosso sistema de saúde já estava sobrecarregado com as epidemias de sarampo, dengue, zika e febre amarela. Que são doenças que já têm vacinas, mas que as coberturas são bastante deficientes. E estava se preparando para vacinação da gripe no outono. Esse quadro de deficiências médicas preocupou muito as autoridades de saúde, muito antes da epidemia ter chegado. Conhecer as nossas fraquezas foi a nossa força.

Como todo o vírus que atinge o estágio de pandemia a solução é esperar que mais de 50% da população seja contaminada e produza imunidade. Se esse processo for muito rápido o sistema de saúde entra em colapso e muitas pessoas vão morrer por falta de atendimento. Não só pelo vírus que está se expandindo, mas também por outras doenças, até por acidentes de trânsito, pois ninguém consegue ser atendido adequadamente.

Uma forma de reduzir a velocidade de propagação do vírus é confinar as pessoas, impedir que elas entre em contato entre si. Só que esse confinamento reduz muito a capacidade das pessoas trabalharem. Para a maioria das pessoas é um grande problema. Elas não têm reservas. Trabalham de dia para comerem à noite. Encontrar um equilíbrio entre os confinamentos e o trabalho foi um grande desafio. Mas que propiciou que a economia brasileira não parasse.

Ser forte na produção de commodities agrícolas ajudou muito. A produção agrícola é capital intensiva. Emprega pouca mão de obra. Houve alguns atritos, mas foram resolvidos. Com isso a confiabilidade da agricultura brasileira aumentou bastante. Os portos não pararam. Recordes foram batidos. Clientes satisfeitos. O que atraiu novos negócios.

Esse é o momento que estamos vivendo, uma ampliação do comércio com vários países. Ser confiável nos momentos de crise é muito difícil, poucos países conseguem. Em consequência, o Brasil vai viver um ciclo muito intenso de expansão da sua agroindústria. Na realidade esse crescimento já começou há dois anos. A Guerra de Trump com os chineses já aumentou as nossas exportações de produtos agrícolas para a China. Apesar dessa concentração, o Brasil continua a exportar para uma grande quantidade de países. Com a desvalorização do real, em relação ao dólar, os nossos preços ficaram muito competitivos, mais do que antes.

O nosso desafio agora é aumentar o volume produzido. A estratégia atual é não formar estoques, exportar tudo que dá, mesmo que isso implique em aumento dos preços internos. O mercado interno faz o ajuste de preços. Por exemplo, hoje os preços internos do milho estão muito altos. O que dificulta a produção de carnes, principalmente frango e suínos. Por outro lado, incentiva o aumento da produção de milho. A safrinha a ser colhida nos próximos meses está estimada em 71 milhões de toneladas. Variações de 10% são possíveis. Só teremos uma boa ideia da safra de milho em agosto. Um crescimento da safra é bastante provável.

O segundo semestre promete um arranque na agricultura brasileira, principalmente no plantio da safra de soja 2020-2021. Neste momento já foi vendida mais 20% dela, um recorde. Os preços dos adubos estão nos patamares mais baixos dos últimos 10 anos, por causa da queda do petróleo. Os embarques da soja nos portos estão acelerados. É bastante provável que os estoques de soja estejam zerados no final do ano. A tendência é que os preços da soja aumentem no segundo semestre, incentivando mais o crescimento da safra de soja.

As exportações de carnes devem aumentar. Com a queda do consumo, em função da quarentena e da queda da renda da maioria dos brasileiros, a exportação vai ser a salvação dos frigoríficos e dos pecuaristas. O que deve aumentar o saldo da balança comercial.

A grande crise no segundo semestre vai ser a queda no consumo interno. A quarentena reduziu muito a renda dos brasileiros principalmente dos mais pobres. A taxa de desemprego vai aumentar muito e levar bastante tempo para voltar aos patamares anteriores, que já estavam altos.

Impacto na economia, causado pelo Coronavírus, vai demorar para ser absorvido. A realidade agora é outra. A economia é outra. O mundo é outro. É preciso aprender a viver neste novo mundo. Tudo é diferente. As velhas estruturas estão arruinadas. Um novo mundo pulsa. Uma nova realidade precisa ser aprendida.

A vitalidade do novo é assustadora. Tudo é possível. Tudo é imaginável, desejável, construível. Um mundo novo desabrocha com vigor. Que diferença entre o passado imóvel, decadente e miserável. No qual o político era tudo, o desejo ser funcionário público, passar nos exames e conquistar uma estabilidade financeira que mata o desejo e congela a felicidade.

Agora o sol penetra e aquece. A liberdade embriaga, tudo é possível. O brasileiro tem orgulho de ser brasileiro. De ser empreendedor. O agronegócio oferece inúmeras oportunidades. Só que elas não estão nos grandes centros urbanos, estão no interior. Principalmente nas rotas de exportação. Os gargalos estão sendo retirados, o que está possibilitando o aumento dos volumes exportados. Os portos do norte do país são os que mais estão crescendo. Seguindo estas rotas, a agroindústria também cresce. A infraestrutura do interior está melhorando rapidamente. A distância dos grandes centros está diminuindo.

Esse movimento de descentralização está mudando o Brasil. O interior está ficando rico, os grandes centros urbanos, decadentes. É preciso seguir as rotas do crescimento para ser empreendedor.

Os grandes centros urbanos vão ter que se reinventar. As pessoas aprenderam a se deslocar menos. Muitas das suas atividades podem ser feitas em casa. As redes sociais vão dominar. O desperdício do deslocamento vai se reduzir muito. Os motoboys vão reinar. Tudo vai ser entregue em casa. Os estoques vão diminuir bastante. Tudo estará ao alcance da mão. A concorrência de preços vai ser atroz. Muitas lojas vão desaparecer, supermercados, shopping centers. Pessoas vão se deslocar muito menos. Vão perder muito menos tempo. As ruas ficarão vazias, com hoje. Talvez não tanto, mas não serão mais como antes.

As pessoas terão mais tempo para si. Os encontros físicos serão mais esporádicos, o contato virtual muito mais frequente. Tudo vai ser virtual. Será a descoberta do eu interior. O eu que desconhecíamos. É um mar interior. É preciso aprender a navegar, voar nesse mar.

Como pode uma simples doença transformar o caminho da humanidade? O eixo econômico deixou de ser o dominante. A qualidade de vida agora vem em primeiro lugar. O medo da morte religou todos os seres humanos do planeta. Fazia tempo que a Terra não fazia uma reflexão tão profunda. Vai sair renovada dessa crise.

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